2020, dê uma chance para ele!
Ele acordou no seu primeiro dia ainda em clima de festa. Na mesa estavam os restos da ceia de réveillon, comida farta, muitas taças de champanhe. Não havia razão para se preocupar com a “bagunça” afinal ele estava animado e feliz com tantas felicitações que recebeu.
Réveillon na língua francesa significa “reanimar”, “despertar”, e esse era o seu propósito. Trazer esperança e bom ânimo àqueles que abriram o coração para recebê-lo. E tudo estava indo tão bem! Os planos e projetos sendo revistos e compartilhados, os acontecimentos da natureza sendo respeitados, a ciência inovando, a história caminhando. Contudo, havia um porém, alguma coisa parecia descontrolada.
Já era carnaval e as pessoas estavam se esquecendo das promessas que fizeram no início de ano, promessas de fazer um ano novo realmente novo, de ser diferente, fazer diferente, ser mais presente… Promessas que ele presenciou e registrou em cada olhar, em cada abraço, em cada cartão, em cada lágrima de emoção quando a contagem regressiva começou no dia 24 de dezembro de 2019.
Então, ele resolveu dar um susto em todos. Éh! O ano de 2020 foi mesmo surpreendente. Não querendo “ser velho” antes do tempo, resolveu paralisar o mundo e “despertar” os homens para uma outra realidade. “Ele foi cruel”, você vai dizer. Mas, ele só estava com medo de perder a essência que o reconstrói e o renova todas as vezes que nós “estouramos” um champanhe no réveillon. E assim, anunciou uma tal pandemia.
Ele nos fez diminuir o ritmo e perceber que estávamos indo para um caminho de destruição. Alguns se sentiram encurralados, como que jogados dentro de uma gaiola sem poder sair. Escravos do medo, desconfiamos da comida, da entrega, do vizinho, do vendedor ambulante, do colega de trabalho, até mesmo dos amigos e familiares… Qualquer um poderia estar portando contra nós uma arma chamada coronavírus.
“Ele foi injusto”, você vai dizer. O ano de 2020, foi um carrasco permitindo “lockdown”, permitindo que tanta gente perdesse o emprego, que tanta gente abandonasse seus projetos e engavetasse seus sonhos, permitindo que tanta gente morresse de covid-19. Nunca se viu algo assim no mundo! Surpresos, olhamos para 2020 como um inimigo. Ele já não tinha o mesmo brilho do réveillon, nem mesmo a alegria daquela noite ou manhã do outro dia. Ele parecia enevoado pelo céu cinza que se forma todas as vezes que vem uma tempestade.
Os aeroportos fecharam, a bolsa caiu, a carne subiu de preço, o lazer tornou-se perigoso; nada de bares, restaurantes, corridas no lago, passeios nos parques, piquenique na praia. Isolamento, distanciamento, fechamento, confinamento, máscara obrigatória, álcool em gel. Nada de abraço ou aperto de mão, nada de aglomeração, nada de confraternização. “Ele foi insensível”, você vai dizer.
Como definir um ano que nos deixou sem definições sobre o que fazer ou para onde ir. Como descrever um ano em que descobrimos nossa fragilidade, em que a necessidade urgente de mudarmos nossos hábitos ficou tão evidente. Uma só palavra, nem uma só frase é capaz de explicar o que sentimos, experimentamos ou descobrimos.
Então, quando alguns já o amaldiçoavam e expressavam o desejo de esquecê-lo para sempre, os primeiros resultados do seu plano nefasto começaram a aparecer. As ruas vazias, sem gente e sem carros, sem poluição, abriram espaço para que os animais viessem nos visitar novamente, rios se recuperaram e, em alguns lugares, o céu ficou azul de novo. Eu vi os pássaros na janela e eles sorriram para mim, estavam felizes como há muito tempo não se via.
No condomínio, os vizinhos que nem se conheciam, agora se juntavam para ajudar os mais velhos. Algumas pessoas resolveram mostrar seus talentos para o mundo e as sacadas viraram palcos para muitas apresentações artísticas. De repente ninguém se incomodava mais com a cantoria da Ana, nem com a batedeira do Laercio ligada todos os dias. Na internet, milhares de pessoas compartilharam suas vidas, suas histórias, seus conhecimentos e milhares se uniram em campanhas de solidariedade.
Agora, que os seus 365 dias estão chegando ao fim, ele parece menos inexorável. Continua nos alertando sobre o perigo do coronavírus, mas, espera descansar na certeza de que aprendemos algumas lições, preciosas lições. Aprendemos a nos cuidar melhor; a valorizar as pequenas coisas; a declarar que filhos e pais são nossos maiores tesouros; aprendemos a respeitar os idosos e a nos encantar com aqueles que doam suas vidas para ajudar aos outros; a admirar heróis humanos; aprendemos que podemos repartir ou compartilhar um pouco do que temos e somos; a valorizar os pequenos gestos; a olhar o próximo (mesmo a distância) com muito mais afeto; aprendemos a viver com pouco e a esperar mais, rompendo com a impaciência do ritmo acelerado que a vida tinha antes da pandemia. Mudamos quem somos, mudamos o jeito de fazer as coisas, mudamos o ritmo, mudamos o rumo.
Enquanto alguns ainda teimam em dizer: “já vai tarde”, “adeus ano velho”, “até que enfim”, eu insisto em dizer que temos muito a agradecer a ele. É claro, ainda choramos as muitas mortes, eu também vivi a dor do luto em 2020. Mas, não podemos negar o que foi bom, não podemos ignorar o aprendizado, nem sequer deixar de notar o quando ele se esforçou para nos “despertar” literalmente.
Tanto quanto eu e você, ele está ansioso para se renovar em 2021. Assim como nós, ele também faz planos para o novo ano. Ele também deseja prosperidade, alegria, amor, e principalmente saúde. Ele já fez a sua lista de promessas para o réveillon de 2021 e nela está a afirmativa de que se dará ou fará tudo por nós, como trazer uma vacina contra o verdadeiro inimigo de 2020, o coronavírus. Então, dê uma chance para ele, dê uma chance para você mesmo e, renove-se no ano que está chegando. Feliz Ano Novo!
Foto de capa: pixabay
Mônica Carvalho Costa – jornalista, profissional da área de comunicação e líder cristã.
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